Sunday, January 27, 2008

Afro-brasileiro



Na seção Ilustrada, a Folha de S. Paulo publica hoje (27-01-08) um texto do Ferreira Gullar que merece ser lido. A crônica do Gullar nada mais é que uma série de perguntas que problematizam algumas unanimidades do politicamente correto. Quero comentar uma das perguntas que lá aparecem: "Designar negros e pardos como afro-brasileiros significa que brasileiros são apenas os 'brancos'?".
A partir da pergunta, fiquei pensando como adjetivar a minha condição de cidadão deste país. Se obedecer a lógica da questão colocada pelo Gullar, tenho de me apresentar, na ordem decrescente de minhas raízes, como lusitano-ítalo-afro-índio-brasileiro. Esta é uma solução fundada na genética e do que sei dos meus ascendentes de 1700 para cá. Mas ela não seria aceita nas eras racistas dos Estados Unidos. Naquela época, qualquer vinculação provável com algum ascendente negro era motivo suficiente para caracterizar uma pessoa como preto (hoje, afro).
Parece que a boa intenção de utilizar o prefixo afro para designar a condição de pessoas que têm ascendência da mãe África não é uma boa idéia. Parte significativa da população brasileira merece o adjetivo, mas não pode utilizá-lo com exclusividade. Vai ter de misturá-lo em doses variáveis com luso, germano, nipo, polaco, hispano, russo, grego, sírio, libanês etc. Ou, se predominar a perspectiva de que a mancha negra é indelével e anula as demais origens, o adjetivo afro acabará sendo a marca da grande maioria do povo brasileiro.
Há ainda uma outra possibilidade que precisa ser considerada. Ao que tudo indica nossa espécie surgiu nas savanas da África numa data que os especialistas situam por volta de 150 mil anos atrás. De lá, o inquieto homo spiens, migrou para o atual Oriente Médio há uns 60 mil anos (talvez mais cedo que isso). E nos anos subsequentes foi ocupando todas as áreas do planeta. Em resumo, somos todos africanos. Daí, cada um de nós pode usar com muita propriedade o adjetivo afro. Assim, aquele sueco loirinho, nascido no país nórdico deve, com fundadas razões científicas, ser designado como afro-sueco.
Toda essa fala sobre o texto do Gullar não é conversa fiada. Ela mexe com uma questão importante, o racismo. Ela também mostra a necessidade de que conheçamos com mais propriedade nossas raízes africanas. Mama África é a casa original de todos os seres humanos.

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