Monday, September 17, 2007

Os congressos estão acabando?

Acabo de voltar de um congresso, a VII Jornada Catarinense de Tecnologia Educacional. E voltei com a sensação de que os congressos estão com os dias contados. Em todas as palestras e seminários da Jornada muitas pessoas chegavam com grande atraso, algumas saíam e entravam constantemente durante as sessões, muitas saíam antes do encerramento dos trabalhos. Já venho observando tal comportamento há algum tempo.
Alguém poderá dizer que a falta de atenção do público nas sessões de congressos é função da capacidade dos conferencistas em manter o interesse das platéias. Acho que isso explica o fenômeno em parte. Mas, tanto na Jornada com em outros eventos, o entra e sai dos participantes aconteceu também com conferencistas reconhecidamente competentes.
Acho que explicação mais plausível pode inpirar-se numa observação de Neil Postman em Amusing Ourselves to Death. Postman observa que é cada vez menor a capacidade das pessoas em acompanhar durante muito tempo (algo superior a dez minutos) exposições orais logicamente bem arranjadas. Essa capacidade exige gosto por um pensamento analítico mais ou menos rigoroso. Exige certa disciplina intelectual. Exige atenção continuada. Parece que os novos paradigmas de comunicação não favorecem a mencionada capacidade.
Novos formatos de comunicação, sobretudo os utilizados pela TV, pelo cinema e pela internet, não promovem análises logicamente estruturadas. Não promovem exercícios mais exigentes de raciocínio. O público se acostumou a informações muito sintéticas comunicadas em pequenas doses. Acostumou-se também a informações empocatodas em contextos fortemente emocionais - as informações que recebemos via novos meios de comunicação têm por objetivo mais emocionar que fazer pensar.
Os modos de informar predominantes nos meios de comunicação acabaram contaminando a educação. Qualquer exposição mais ou menos longa é vista com certo horror por educadores e educandos. É cada vez menor a chance de se desenvolver nas escolas o gosto por apresentações com rigor lógico e tempo necessário para um encadeamento de raciocínio que dê conta do recado.
Sem número representativo de pessoas capazes de acompanhar com proveito apresentações mais ou menos longas e estruturadas com certo rigor lógico, acredito que os grandes cogressos perderão sentido e desaparecerão. Restarão alguns pequenos eventos para especialistas.
Haverá espaço para grandes eventos? Talvez sim. Mas, inteiramente mudados. Possivelmente os novos caminhos incluam coisas tais como: teatralização das apresentações, oficinas, seminários para pequenos grupos, apresentações apoiadas por música. Não ouso apresentar um lista completa de alternativas. Mas sinto que o formato de grandes eventos que valorizam o pensamento analítico é uma espécie em extinção.

7 comments:

Anonymous said...

Concordo que a atenção das pessoas esteja se transformando em função da intensidade do fluxo de informação disponível atualmente. Sem dúvida isso gera platéias mais ansiosas e objetivas.
Os organizadores de eventos como esses deveriam repensar os formatos tradicionais (conferência, congresso, ect) e buscar alternativas mais compatíveis com nosso ritmo de vida (desconferências, open space, etc), não acha?

Jarbas said...

Alô Luiz. Concordo. Acho que os formatos de comunicação pública deverão mudar completamente se quisermos dar continuidade a grandes encontros para conversas sobre determinados temas ou interesses. Comunicações tradicionais (sobretudo a velha conferência), baseadas em uma sociedade que valorizava a oralidade, perderão cada vez mais força comunicativa. Sinteticamente, como dizia um de meus gurus, Neil Postman, "a tecnologia dá, a tecnologia tira". Modos de comunicação competem por espaço, por grana, pelo coração das pessoas. E os modos mais antigos quase sempre são obrigados a ceder espaço para os novos. E é uma pena que a antiga e elegante conversa esteja sem muito espaço em nossos dias. O mesmo pode ser dito com relação ao texto mais elaborado e longo.
Por outro lado, acho que não podemos aceitar as perdas pacificamente, uma vez que a boa conversa e o bom texto têm virtudes que não estão presentes nos novos meios.
Fica uma pergunta: que fazer?
Abraço, Jarbas.

Fátima Campilho said...

Penso que está na hora de recuperarmos a capacidade de ouvir. Nós acompanhamos um congresso com relativa facilidade, fazemos anotações, encaminhamos perguntas à mesa, etc. A nova geração leva gravador e come pipocas, tal qual num cinema! Presta atenção se for de aventura, ação, terror. Muita informação, não dá nem tempo de digerir, quanto mais pensar. Isso dá muito trabalho! Os grandes pensadores já resolveram tudo por nós!
Falei do tema com outra abordagem ao analisar um livro de Cléo Busatto. No momento, estou lendo outro: A Arte de Contar Histórias no Século XXI.
Abraços.

Jarbas said...

Alô, Fátima.
É... parece que as novas geraçõess têm um problema crônico de atenção. Talves precisemos pensar em altenativas que permitam uma recuperação, pelo menos parcial, da capacidade de acompanhar discursos estruturados e analíticos.Mas, ao mesmo tempo, acho que é preciso compreender melhor os modos de comunicação que surgiram com a cultura de massas (revistas populares,rádio, nova imprensa, cinema, TV, computadores etc.). E dessa compreensão, parece-me que podem surgir idéias de como tornar mais vivos e interessantes congressos, jornadas e encontros. Estou propondo aqui uma solução de conciliação. Ao mesmo tempo, quero deixar registrado que não vejo com bons olhos entusiasmos deslumbrados com os novos meios. É isso. Abraço, Jarbas

Maisa Fernandes said...

Realmente Jarbas, penso que a desatenção das pessoas é algo preocupante, pois ouvimos e vemos muitas informações mas pouquíssimas são analisadas e compreendidas.
Concordo que não devemos aceitar comodamente isso porque compreender a vida e estar nela de forma plena e edificante exige abstração, análise e reflexão sempre.
O X da questão é conseguirmos conciliar o de valor dos dois lados da situação para que a vivência atual seja mais significativa. Tenho buscado esse caminho.Sucesso para nós.

Sindy said...

Acabei de chegar de um Congresso de 40 horas sobre Avaliação e estava “avaliando” justamente isso: qual a validade de grandes eventos? Daí me deparei com este post...

Sou fã das suas considerações, professor Jarbas, e elas sempre me fazem refletir muito. As transformações que as tecnologias provocam na humanidade me interessam muito e acredito que a educação deva parar e refletir sobre o impacto dos recursos tecnológicos sobre a aprendizagem.

É evidente que os novos formatos de comunicação provocam mudanças nos processos de aprendizagem. Temos uma geração multimídia, acostumada com som, imagem e muito movimento. A vida é um “hipertexto” para os jovens, com links para onde desejarem ir. E com uma velocidade que desconhecemos!

Não sei se é bom ou não, mas é o que eu vejo diariamente. Eles pensam e agem de uma forma muito diferente dos padrões que estamos acostumados. E quando você propõem “pensar em alternativas que permitam uma recuperação”, eu penso que podemos começar a pensar em “novas formas” de acompanhar discursos estruturados e analíticos – pois essa é uma habilidade fundamental para a construção do conhecimento: ser capaz de elaborar e sistematizar o universo de informações disponíveis a um clique (do mouse, do controle remoto,...)

Abraços
Sintian
http://bloguinfo.blogspot.com/

Jarbas said...

Alô Maísa e Sintian,

Muito bom ter vocês por aqui. Melhor ainda é saber que minha percepção quanto a problemas no âmbito do desenvolvimento de capacidades analíticas e de capacidades de seguir com atenção apresentações argumentativas bate com a percepção de vocês. E, acima de tudo, é ótimo saber que há educadores e educadoras preocupados com isso, pois acho que certo entusiasmo pouco crítico (algo que meu amigo Steen Larsen chama de 'deslumbramento negativo")quanto a consequências dos novos meios de informação e comunicação pode nos levar a oferecer uma educação facilitária que, a longo prazo, trará grande prejuízo para as pessoas. De alguma maneira, temos que mudar um pouco o jogo. A tarefa não é fácil, mas necessária. Na continuidade vou postar algumas observações que guardam alguma relação com a questão aqui levantada. Trata-se da falsa avaliação de que as gerações digitais (the digital natives) é capaz de processar simultaneamente três ou mais fontes de estímulo (como por exemplo: estudar, ouvir música, navegar na internet e acompanhar um jogo pela TV ao mesmo tempo e dando conta de tudo...)> Espero que vocês entrem na dança e comentem meu próximo post. Abraço grande, Jarbas.