Saturday, January 27, 2007

Uso de rubricas em avaliação

Há bastante tempo, optou-se por rubricas como instrumento de avaliação em WebQuests. Tal opção foi tranquila nos EUA e Canadá, países nos quais o uso de rubricas como instrumentos de avaliação está bem difundido. No Brasil e em outras partes, porém, quase sempre as matrizes avaliativas características das rubricas têm um ar de novidade. E como não há muita literatura sobre tal alternativa de verificação de aprendizagem, os educadores manifestam diversas dúvidas sobre a matéria. Na última semana mantive um diálogo interessante sobre a questão com o Professor Eziquiel Menta. Uso este post para compartilhar um dos comentários que fiz a partir de uma pergunta do Eziquiel:

>Se for buscar a origem das rubricas, devo me reportar à taxonomia de Bloom?

_ As rubricas não se vinculam a pesquisas como a realizada por Bloom e seu grupo de colaboradores. Elas nasceram em meios que exigem claramente avaliações baseadas em produtos elaborados pelos alunos (aprendizes): as instituiçoes de formação profissional. Exemplo: como avaliar se o aluno de marcenaria aprendeu a fazer uma mesa? A resposta é óbvia: ele deverá ser desafiado a produzir uma mesa. Mas tal resposta não resolve completamentea questão. Nos meios de formação profissional sempre se questionou o subjetivismo do julgamento dos peritos (mestres, instrutores) na hora de julgar um produto feito pelos alunos. Para amenizar tal subjetivismo, surgiram algumas orientações em termos de instrumentação da avaliação. Uma delas foi a utilização de um corpo de jurados para classificar a qualidade de obras de autoria dos aprendizes. Para que um corpo de jurados funcione adequadamente é preciso estabelecer certo consenso sobre critérios a serem utilizados. Nesse caso temos um elemento chave no tipo de avaliação em análise: um lista de critérios transparentes e públicos (ou seja, o aluno sabe, desde o início do processo de ensino-aprendizagem, quais as exigências que serão consideradas na avaliação daquilo que ele produzir). Outra possibilidade que apareceu nos meios de formaçãoprofissional foi o uso de check-lists, uma relação de exigências definidoras de expectativas quanto a um produto ou a um serviço. Finalmente, com metas bastante parecidas com as das duas possibilidades anteriores, surgiram as rubricas, matrizes nas quais os avaliadores estabelecem uma lista de critérios combinada com descritores de possíveis níveis de execução. Nos meios de formação profissional, as soluções que elenquei funcionaram quase sempre como resultado de intuições dos mestres. A literatura não registra grande contribuição da academia ou da pesquisa universitária no campo em análise. As rubricas nasceram sobretudo de invenções de educadores que trabalhavam no "chão da escola". Os profissionais de educação da área achavam que tais soluções eram mais ou menos óbvias. Afinal de contas, não faz sentido avaliar capacidade de fazer uma mesa por meio de uma prova escrita sobre marcenaria...

Nos meios de educação geral, o uso de rubricas surgiu, nos Estados Unidos, por volta dos anos 70 para encaminhar a questão de como avaliar redação (cf. W. James Popham, Testing! Testing! What every parent should know about school tests, Needham Heights, MA: Allyn & Bacon, 2000). A solução rubricas é algo mais ou menos óbvio no caso da aprendizagem de redação. O aluno precisa saber que qualidade tem aquilo que ele produziu. Uma nota, no caso, representa muito pouco. O que um candidato a escrevinhador precisa saber é quais são os pontos fortes e fracos em sua produção. Para isso, o avaliador precisa estabelecer critérios que lhe permitam dialogar de modo objetivo com o avaliado. O uso de rubricas facilita tal diálogo.

Thursday, January 25, 2007

Dizer a própria palavra

No título deste post tento sintentizar uma das esperanças de Paulo Freire; um cidadão livre é aquele que conscientemente é capaz de dizer a sua própria palavra. Nosso maior educador não chegou a publicar um blog, mas era alguém que alimentava muitas expectativas com relação às possibilidades libertárias da rede mundial de computadores. E, certamente, apreciaria muitos dos usos dos blogs em nossos dias. Faço tais reflexões a partir de um diálogo de Freire com um grupo de educadores sobre tecnologia educacional; diálogo do qual tive o privilégio de participar..Um exemplo fantástico de possibilidade de dizer a própria palavra, proporcionada por blogs, é Baghdad Burning, o diário eletrônico publicado por uma jovem iraquiana que assiste diariamente aos efeitos da ocupação estrangeira em seu país. A edição do New York Review of Books de 11/01/2007 resenha alguns livros recentes sobre o Iraque. Um dos livros resenhados é uma compilação das mensagens de Riverbend, a blogueira de Bagdá. A autora, uma profissional de informática, faz um registro admirável de como é a vida de cada dia no Iraque ocupado. Na resenha, observa-se que o texto (em inglês) da moça deixaria muitos americanos envergonhados. E eu acrescento: deve envergonhar também muitos profissionais da área de computação. O texto é limpo, atraente, sedutor, além de fazer uma leitura muito bem informada dos acontecimantos. Mas, para além dos aspectos formais, o texto é um registro histórico imprescindível para quem queira entender o que está acontecendo no Iraque. Riverbend encontrou no blog uma forma de dizer com liberdade sua palavra sobre a experiência trágica sua e de sua terra. Baghdad Burning merece ser lido.Ao ler a matéria do New York Review of Books fiz uma relação inevitável: os blogs continuam censurados (bloqueados) em muitas escolas. Uma pena! Nessas escolas, alunos e professores perdem um importante canal para dizer suas próprias palavras. Dias depois de ler a matéria sobre a blogueira de Bagdá, fiquei sabendo de mais uma medida (anunciada nos jornais de 23/01/2007) contra a liberdade de dizer a própria palavra: o COB (Comitê Olímpico Brasileiro) baixou norma para impedir que os atletas brasileiros publiquem qualquer coisa em seu blogs durante os próximos Jogos Panamericanos. Cabe um pedido de socorro a nosso querido Paulo Freire.

Tuesday, January 23, 2007

Educação: demitir "velhos" para inovar (4)

A questão do velho trabalhador é abordada em algumas obras da música popular brasileira. Nas canções, o sacrifício de animais inservíveis para a produção geralmente funciona como uma metáfora para o afastamento de trabalhadores que já chegaram numa idade que os patrões consideram avançada. Florênciao Guerra, canção gaúcha, é um exemplo disso:

Florêncio afiou a faca para sangrar seu cavalo
Florêncio guerra das guerras do tempo em que seu cavalo
Pisava estrelas nas serras pra chegar antes dos galos
Florêncio afiou a faca pensando no seu cavalo
Parceiros pelas lonjuras na calma das campereadas
Um barco em tardes serenas um tigre numa porteira
Pechando boi pelas primaveras sem mango sem nazarenas
O patrão disse a Florêncio que desse um fim no matungo
Quem já não serve pra nada não merece andar no mundo
A frase afundou no peito e o velho não disse nada
E foi afiar uma faca como quem pega uma estrada
Acharam Florêncio morto por cima do seu cavalo
Alguém que andava no campo viu o centauro sangrado
Caídos no mesmo barro voltando pra mesma terra
Que deve tanto ao cavalo e tanto a Florêncio guerra

Enfatizei a fala do patrão no verso "Quem já não serve pra nada não merece andar no mundo". Florêncio Guerra é uma canção de Mauro Ferreira e Luiz Carlos Borges, ganhadora da Califórnia da Canção Nativa, versão 1991. Há um site que passa uma boa idéia do que é a Califórnia, apresentando letras das músicas, relação das canções premiadas, vídeos das versões mais recentes do festival etc. Se você quiser visitar a Califórnia basta clicar aqui.

Monday, January 22, 2007

Çatalhoyuk na Web


Depois de minhas recentes leituras sobre o Neolítico, fiz alguns levantamentos na internet sobre sitios arqueológicos daquele período histórico. Descobri que há bastante coisa sobre Çatalhoyuk, a primeira cidade construída por nossa espécie. E mais: há um material feito especialmente para educação. Trata-se de uma publicação web com informações e atividades desenvolvidos para jovens com escolaridade equivalente à 7ª série do ensino fundamental: Mysteries of Çatalhoyuk. Tal publicação é uma inciativa do Science Museum of Minnesota e faz parte de uma coleção de atividades científico-educacionais que podem ser encontradas no site daquela institução.
Pena que Mysteries of Çatalhoyuk seja em inglês. De qualquer forma, vale a pena dar uma olhada no material para ver algumas possibilidades interessantes de ensino e aprendizagem de história a partir de pesquisas arqueológica importantes. O material publicado pelo museu tem um planejamento de ensino (instructional design) interessante. Acho que algumas atividades, apesar de prováveis dificuldades linguísticas, poderiam ser trabalhadas nas escolas.

Saturday, January 20, 2007

Vacina contra arrogância informacional

Tomei mais uma dose de vacina contra a arrogância informacional. Acabo de ler Inside The Neolithic Mind, obra de David Lewis-Willians e David Pearce. Eventuais leitores devem estar perguntando: o que é arrogância informacional? Explico-me. Volta e meia alguém diz: "nos últimos X anos produziu-se mais conhecimento que em toda a história prévia da humanidade". Alguns anos atrás, o X de tal afirmação era igual a duas décadas. Hoje tal X tem o valor de cinco ou menos anos. Pura bobagem! Essa afirmação descabida confunde capacidade de produzir (e reproduzir) informação com capacidade de gerar saberes originais e significativos. Ela equipara a invenção de um alfabeto a qualquer hipótese irrelevante supostamente comprovada numa tese de doutorado numa universidade medíocre. Inside The Neolithic Mind procura esclarecer os significados de representações religioso-cosmológicas da era neolítica no Oriente Médio e na Europa Mediterrânea. É um mergulho de profundidade nos mares de evidências arqueológicas de sítios como Çatalhoyuk (uma das primeiras cidades do mundo) e Bru na Boinne (um dos conjuntos mais impressionantes de monumentos megalíticos da Europa). A obra é um bom complemento para o indispensável After The Ice, livro de Steven Mithen que procura traçar um panorama da aventura humana de 20.000 a 5.000 AC. Ao ler obras como as citadas, a gente desenvolve profunda admiração pela capacidade inventiva de nossa espécie. Domesticar animais e plantas, desenvolver métodos para converter cereais em itens da gastronomia humana, construir representações que davam sentido a percepções do universo etc. foram façanhas dos grupos humanos que viveram nos quinze mil anos que precedem os inícios daquilo que costumamos chamar de civilização. Entender e admirar os feitos de nossos ancestrais é certamente uma providência para que coloquemos nossa tecnologia e ciência dentro de uma perspectiva histórica rigorosa. Caso contrário praticaremos uma arrogância informacional cuja única justificativa é o analfabetismo em História.

Thursday, January 18, 2007

Educação: demitir "velhos" para inovar (3)


O episódio que narrei em 20 de dezembro último é um exemplo da ausência de atenção para um fenômeno crescente que, sem dúvida, vai mudar radicalmente a vida em sociedade: o envelhecimento acentuado da população. Em muitas partes do mundo o grupo de pessoas com idade igual ou superior a sessenta anos já é igual ou está próxima a um quinto do total dos cidadãos. As consequências de tal fenômeno no plano do trabalho e da educação ainda não estão sendo consideradas com atenção por pesquisadores, governos e sociedade. Mas já há algum esforço no sentido de entender o que está acontecendo. Em 1997, O ERIC -Education Resources Information Center publicou um resumo sobre a matéria, preparado por Susane Imel. Traduzi o trabalho da professora Imel para o português e divulguei-o com a seguinte mensagem:

Pouca ou nenhuma atenção é dada à demografia em processos de mudanças organizacionais. Fica parecendo que as novas configurações dos grupos etários não faz parte do contexto. As análises de tendências aparentemente desconhecem que a idade da força de trabalho está sofrendo alterações significativas: proporcionalmente o número de jovens trabalhadores tende a diminuir e o número de trabalhadores mais velhos tende a crescer. Ao que tudo indica, as estruturas de emprego e trabalho, dadas as tendências demográficas cujos efeitos já começam a ser sentidos, deverão mudar substancialmente para acomodar as novas configurações das faixas etárias da população economicamente ativa.

Este tema, pouco considerado nas projeções que se fazem quanto ao futuro do trabalho, mereceu um levantamento do “estado de arte” por parte da pesquisadora Susan Imel. Tal levantamento faz parte do acervo da Clearinghouse on Adult, Career and Vocational Education, o centro de educação de adultos do serviço americano de documentação sobre educação (ERIC).

Não há aqui espaço para mais comentar o levantamento bibliográfico feito por Susane Imel. Se alguém quiser cópia da tradução que cometi em 1997, entre em contato em jarbas@sdsualumni.org .

Tuesday, January 16, 2007

Educação: demitir "velhos" para inovar (2)

Pretendia considerar mais imediatamente outros aspectos relacionados com o episódio de dispensa de "velhos" educadores em nome da inovação. Mas resolvi deixar novas considerações para mais tarde. Motivo: comentários de duas amigas blogueiras que indicaram o potencial de discussão que minha mensagem poderia ter. Um dos comentários foi o da Miriam Salles que repercutiu meu post no blog dela. Outro comentário foi o da Carmé Barba que traduziu o meu texto para o catalão e o colocou como tema do mês numa "bitacora" coletiva. Ao perceber a possibilidade de realizar uma boa conversa sobre certos rumos da tecnologia educacional a partir do mencionado episódio, decidi dar um tempo, convocar alguns educadores amigos, e aguardar mais comentários. Objetivo: afinar minha viola para a animação futura de um fórum dedicado à próxima Jornada Catarinense de Tecnologia Educaciohnal. Em outras palavras, estou utilizando a oportunidade para descobrir modos de propor uma conversa produtiva sobre usos das TIC no espaço educacional. Enquanto isso, as considerações que eu havia planejado vão ficar na gaveta.