Sunday, February 15, 2009

Educação e música: o começo


Depois de algum tempo, volto ao livrinho do Peter Perret: A Well-Tempered Mind - Using music to help children listen and learn. Falo aqui do primeiro capítulo: Fanfare. Escreverei sem referenciar a obra. O que segue é, ao mesmo tempo, resumo e comentário pessoal.

Não se conhece alguém que tenha embarcado na música para ficar mais inteligente. O amor pela música explica-se por amor à arte, por vontade de expressar sentimentos que não podem desabrochar de outra forma. A música traz satisfação pessoal, expressa sentimentos profundos, é inefável. A música coloca nosso corpo em movimento. A música não precisa de outra justificativa que ela própria.

A música sempre foi parte integral da educação. Nossos ancestrais [principalmente os gregos da era pré-homérica] sabiam disso intuitivamente. Infelizmente música e educação geral se separaram nos sistemas escolares modernos. Em parte isso explica (e é resultado da) a má qualidade da educação. Vista como "arte", a música converteu-se em artigo de luxo ou atividade marginal na educação escolar.

Em 1996, os alunos do terceiro ano do ensino fundamental da Bolton Elementary School tiveram notas sofríveis no teste estadual de desempenho escolar. Apenas 40% deles chegaram ao mínimo esperado ou acima desse patamar. Mas o fato não era surpreendente. Bolton era uma escola com a maioria dos alunos pertencentes a grupos economicamente desfavorecidos ou com sérios problemas sócio-psicológicos.

Um ano depois, cerca de 90% dos terceiranistas de Bolton obtiveram notas iguais ou superiores ao mínimo desejável no exame estadual. Nada havia mudado no perfil dos estudantes de Bolton. Nada havia mudado na organização da escola ou em seus recursos. A única mudança havida fora a exposição dos alunos a um programa musical conduzido por um quinteto de sopro da orquestra sinfônica de Wiston-Salem. O programa, iniciado em 1995, consistiu em colocar os músicos do quinteto como "residentes" na escola.

A "residência" do quinteto resultava em exposição musical de meia hora, duas ou três vezes por semana, nas classes dos primeiros anos do ensino elementar de Bolton. O quinteto ingressava nas salas e executava uma peça curta. Depois disso, as atividades podiam variar de acordo com um plano previamente combinado com a professora da turma. Tais atividades podiam incluir explorações sobre as particularidades de cada instrumento (diferenças nos sons, sons mais graves, sons mais agudos, relação entre tipo de som e tamanho do instrumento etc.). Podiam incluir também explorações de caráter conceptual ilustradas pela música. Exemplo: descoberta de opostos -longo/curto, grave/agudo, alto/baixo. O quinteto não foi à escola para ensinar musica, mas para ensinar por meio da música. Essa observação merece ser explicada.

Há algumas alternativas para a música na escola. Uma delas é a de voltar aos velhos tempos e ter música no currículo como uma disciplina importante (tão ou mais importante que o estudo do idioma nativo e da matemática). Outra é a de utilizar música para o ensino de um outro conteúdo. Exemplo disso é utilizar uma melodia muito conhecida para aprender o alfabeto em inglês. Finalmente há a opção de utilizar música como uma produtora de analogias que podem iluminar certos conteúdos de outras disciplinas. A primeira alternativa ainda é um sonho.A segunda alternativa é a visão hegemônica (e muito pobre) de utilização da música no espaço escolar. A terceira opção é um modo criativo de articular conteúdos musicais com conteúdos de outras disciplinas. É a opção desenvolvida pelo projeto Bolton.

Por causa dos resultados obtidos, o projeto Bolton tornou-se conhecido mundialmente. Mas a associação da música com determinados conteúdos do programa escolar ainda não tem uma de caráter estritamente científico. As questões que seguem já tem certa resposta positiva a partir da experiência dos músicos do quinteto e, ao mesmo tempo, orientam observações que vem sendo feitas por pesquisadores nas áreas de educação e neuropsicologia:

  • O trabalho dos músicos na sala de aula afetou diretamente resultados no campo da aprendizagem de matemática?
  • A canção A Little Night Music criou um número expressivo de leitores brilhantes?
  • O que ouvir música tema ver com aprender a aprender?
  • Como escutar música melhora atenção, capacidade de concentração e aprender a escutar?
Essas e outras questões parecidas sugerem modos de trabalhar música no espaço escolar. Essas e outrras questões animaram e animam o trabalho de músicos profissionais da orquestra sinfônica de Wiston-Salem em seus contatos com as crianças da escola Bolton.

3 comments:

Carme Miró said...

Moltes gràcies, Jarbas, pel teu comentari tan bonic que fas sobre la música.

Salutacions ben cordials des de Barcelona

Jarbas said...

Carme,
Grande prazer tê-la por aqui. Seu trabalho com música é inspirador. Sempre recomendo seu blog e a revista que você edita. Abraço grande desde São Paulo.

biapedag.blogspot.com said...

Oi, Jarbas! Tudo bem?
Lendo algumas de tuas postagens eu me recordei de dois momentos que pude registrar, lá na Escola Especial onde trabalho. Eles se referem ao trabalho realizado pela professora de Música, Rejane Dubois, com alunos autistas e psicóticos. O improviso de gaita é com um de meus alunos que tem grande habilidade musical. Bom, poderia ficar um tempão relatando nossas histórias..mas não é esse o objetivo. Quero partilhar contigo esses dois momentos do trabalho de uma professora que muito admiro.
Coloco o endereço:
http://lucenorges.blogspot.com/2008/11/kael.html

http://lucenorges.blogspot.com/2007/12/assemblia-se-despede-em-grande-estilo.html